Novo filme de Stephen Daldry vai agradar àquela parcela do público que adora ter um lenço do lado quando vê um filme. |
Texto: Demetrius Caesar (do Cineplayers ) |
Stephen Daldry não estava para brincadeira quando embarcou no projeto de adaptar para as telas o best-seller Extremely Loud and Incredibly Close, publicado
em 2005, de Jonathan Safran Froer. Seus filmes são melodramas
desbragados, e o diretor não poupa seus atores de torrentes de
lágrimas, crises histéricas e os mais surrados clichês da psicanálise,
generosamente regado com música insistente e lacrimosa. Não foi,
portanto, com sutileza que o primeiro blockbuster a tratar do atentado
às Torres Gêmeas em Nova York, em setembro 2001, chegou às telas, mas
kitsch, grandiloquente, e, às vezes, tão insuportável o título que deram
à obra no Brasil.
Para se ver os filmes do diretor inglês, é preciso de
uma dose extra da chamada "suspensão da realidade", a mesma que anima
em especial os filmes de ficção científica e outras obras implausíveis. O
protagonista, um menino de 11 anos com Síndrome de Asperger (espécie de
autismo em que o indivíduo desenvolve certa resistência à interação
social e uma disposição a falar ininterruptamente), vai quebrar a
cozinha da casa, destruir parte de uma fábrica de fechaduras e, depois
de muitos gritos, choro, correria, atitudes desesperadas e ofensas
verbais múltiplas, vai berrar para mãe que ela e não o pai deveria estar
no World Trade Center no "pior dia", como ele diz. Mais adiante, para o
suposto avô, também a plenos pulmões, diz que ele foi o pior de todos.
Parece uma novela da Gloria Perez ou uma dessas mexicanas que passam à
tarde no SBT.
Salvo os coadjuvantes que aparecem muito rapidamente,
todos os demais personagens vão derramar copiosas lágrimas, mais de uma
vez inclusive. Sandra Bullock, envelhecida e com os cabelos grisalhos,
mantém a carranca consternada, dolorida, sofrida, sempre pronta para o
choro (que explode em geral um minuto depois que ela entra em cena),
sempre vestindo roupas de tons neutros. É quase uma mártir. Entre as
cenas de alto teor melodramático, há uma em que o marido liga do celular
numa das Torres Gêmeas para o adeus e, claro, o inevitável "I love
you". As imagens da tevê mostram o prédio desabando depois do corte da
linha. E dá-lhe o piano de Alexandre Desplat - que, é bom lembrar, quase
nunca para de tocar.
"I love you" vai ser dito pelo menos 30 vezes no
filme, ele todo um funeral onde todos se abraçam e se consolam. Há um
motivo para isso, a ser explicado no fim. O roteiro do filme tem lá seus
lances de inteligência (Daldry sabe ser sofisticado quando quer), mas
as reviravoltas parecem forçadas ou apenas meros subterfúgios para,
evidentemente, mais uma cena de chororô. Afinal, o rapaz tem de
encontrar as 472 pessoas com sobrenome Black que moram em Nova York (a
princípio, sem mesmo utilizar transporte público, pois o menino tem medo
de túneis) e perguntar a cada uma delas se conheceu seu pai.
A impossibilidade do feito tem seu charme, mas é o
menino mesmo o melhor do filme. Incapaz de perceber o que passa ao seu
lado, egoísta e auto-centrado, torna-se uma metáfora da sociedade
americana depois do atentado, aterrorizada com o outro, o estrangeiro,
com medo de tudo, e ressentida pela perda. A indiferença de Oskar às
maravilhas da cidade-sede do império, da imensa riqueza humana em volta
de si, sua incapacidade de aproveitar os momentos únicos que ele estava
tendo do lado daquelas pessoas, esse é o grande trunfo do filme. Oskar
tem uma doença mental e está, portanto, desculpado. Os outros, ou nós,
os espectadores, não.
O filme, portanto, cresce (e bem) com a entrada de
Max von Sydow, um velho mudo que aluga um quarto da casa da avó do
menino. Ele vai se juntar ao menino na busca e, uma vez em contato com o
estranho, Oskar terá de se comunicar, precariamente, pois o homem
apenas escreve pequenas frases em um bloco de notas. Oskar é intragável
às vezes, o que aumenta a densidade da personagem. Encalacrado na sua
busca, terá de fazer escolhas, ser flexível, encarar a realidade - é
quando o filme tem o seu melhor. Infelizmente, roteiro e direção vão
afundar tudo no mar de lágrimas.
Nesses bons momentos, fica se imaginando o que seria
do filme se Daldry tivesse optado por um pouco de ambiguidade e não ser
tão assertivo em todas as cenas. A melhor coadjuvante é Viola Davis,
soberba, a chave do filme. Ela é a primeira e a penúltima Black com quem
Oskar encontra. No primeiro, ela está às lágrimas (evidentemente)
porque o marido está indo embora. Oskar acha uma foto de um elefante
chorando (até os elefantes choram no filme) e Abby Black dá a foto ao
menino. Na verdade, ela vai lhe dar suas lágrimas, e o menino vai
terminar por chorar também, coisa que ele não havia feito nem no enterro
do pai, na mais bela cena do filme.
É inútil exigir comedimento e discrição a Stephen
Daldry: é o novo rei do melodrama. Ele vai caprichar nos atores (todos
impecáveis), a fotografia sairá linda (principalmente quando foca no
rosto dos atores), as cenas serão bem editadas e o filme terá ritmo, com
alguns diálogos espertos. Tudo chique, até a cena em que voa a caixa de
cereal ou outras gratuidades, como o sem número de vezes que o menino
foi filmado no meio da rua com carros passando ao seu redor, buzinas e
luzes amedrontadoras a circundar o pobre e indefeso. O charme rústico de
Billy Elliot (idem, 2000) não evoluiu para algo mais sofisticado, coisa que Daldry até tentou em As Horas (The Hours,
2002). O diretor prefere mesmo o popular, os sentimentos básicos, a
emoção que brota descontrolada. Talvez por isso sua carreira no cinema
tem sido tão bem sucedida: esse tipo de material é tipicamente
cinematográfico e encontra larga parcela do público.
Tão Forte e Tão Perto (Extremely Loud and Incredibly Close,
2011) fica então por conta do freguês. Se o espectador é capaz de
suportar um melodrama às raias do irracional, o filme será uma
experiência riquíssima. Do contrário, se a tal "suspensão da realidade"
não for totalmente feita, o filme soa apelativo. Se você mantiver os pés
no chão, o filme não fará nenhum efeito, nem mesmo o de ser um
paliativo desse dia fatídico para os americanos e nova-iorquinos em
particular. Vai depender da entrada do espectador no filme e o grau de
envolvimento com o material. Para quem se acaba de chorar em novela,
mesmo com histórias repetidas e situações não muito elaboradas, é prato
cheio.
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